Convento de S. Paulo da Serra D´Ossa
“A que mais se remonta
he a serra de S. Gens, levantando-se em tanta altura, que parece que nam tem as
nuvens vizinhança mais próxima. (…)
Todos estes montes e
serras eram antigamente aspérrimos, & incultos, tudo brenhas, &
altíssimos matos, & por esta causa erão habitados de muitas feras, que a
deixarão de povoar depois que para semearem nellas se principiarão a romper,
& ainda há poucos anos se achàrão estevas em huma herdade deste Convento,
que medidas tinhão de comprimento vinte & seis palmos… poèm nam he triste a
dita montanha, porque supposto consta de tam grandes, & escabrosas terras,
comtudo entre humas, & outras se dilatão fertilíssimos vales, que com a
frescura, & frondoso dos arvoredos, ainda que sylvestres, se mostrão muy
agradáveis, & aprazíveis, principalmente no Estio, porque por uma, &
outra parte nascem muitas fõtoes, que acompanhadas com o canto de muitas, &
sonoras aves, fazem com o seu ruido consonâncias tam suaves, que suspendem os
passageiros, & só a herdades das Cortes, que he granja do Convento da Serra
D´Ossa, & lhe fica em distancia de huma legoa, consta que tem setenta &
tantas fontes, por cuja causa goza esta herdade da frescura de muitos freixos,
da fertilidade de grandes pastos, & do melhor montado, que se acha em todas
aquelas partes. (…) Na melhor parte pois, & mais fresca, & aprazível de
toda esta serra està fundado o principal Convento dos Religiosos de S. Paulo…”
(COSTA, 1708)
Cabeça da Congregação dos monges de Jesus Cristo da Pobre
Vida, em Portugal, as suas raízes históricas perdem-se na obscuridade dos
tempos, entretecidas de piedosas lendas que recuam os seus fundamentos a tempos
imemoriais.
Carecem de bases criticas os eventos hagiográficos
transmitidos pela Pastoral da Sé de Évora e decorrentes nos anos de 1182 a
1376, assim como a cronologia fantástica de santos e milagres dos anacoretas
contidos na Chronica dos Eremitas da Serra D´Ossa, de Fr. Henrique de Santo
António e obra publicada entre 1745-52.
As origens históricas incontroversas, pertencem ao ano de
1376, após o Papa Gregório XI ter aprovado a reforma geral do convento, por
Bula de Avinhão, que nomeou visitadores do nóvel instituto os bispos de Coimbra
e Tuy, respectivamente D. Pedro Tenório e D. João de Castro, religioso que
renunciou à cadeira episcopal e se integrou na ordem paulista.
A casa actual, então governada pelo venerável Mendo Gomes de
Seabra, a terceira em localização, sucedeu ao conventinho de Santo Antão de
Vale do Infante e ao oratório da Valadeira, que se pretende ter sido instituído
com o nome de Espírito Santo, por D. Fernão Anes, mestre de cavalaria de S.
Bento de Calatrava ou de Évora. Foi D. João I que, em 1390 obteve do Papa
Bonifácio IX a isenção dos dízimos das fazendas do Convento e de Gregório XII,
entre 1403-1406, a concessão de outras bulas de indulgências plenárias,
recomendadas aos bispos de Lisboa, Braga e Évora.
Deste período era o primitivo edifício, do qual foi primeiro
prelado João Fernandes e eremitas fundadores Gonçalo Vasques e o ex-cónego da
Sé de Évora Gil Martins. Pelo alvará régio, com força da lei, dado em Santarém
a 20 de Fevereiro de 1434, ficou sob a protecção real, determinando-se, ao
mesmo tempo, que os juízes de Borba não impedissem as obras do mosteiro desviando
delas os oficiais de pedraria que, ao tempo se ocupavam com os muros e castelos
do Alentejo.
Integrado em 1536 na Regra de Santo Agostinho, pelo Papa
Paulo III, no ano de 1578 concedeu-lhe Gregório XIII, a instâncias do Cardeal
Infante D. Henrique, a aprovação da Sagrada Congregação no espírito da letra
das ordens mendicantes e outros benefícios espirituais, que Alexandre VII
confirmou e ampliou conforme os privilégios outorgados aos religiosos de S.
Paulo do reino da Hungria e da Ordem de S. Bruno. São do fim deste século os
estudos que impuseram o escorço geral do presente mosteiro, conjunto de obras
que sucessivamente modificado e engrandecido, sobretudo a partir do reinado de
D. João IV, que muito acarinhou a comunidade, alcançou os seus sucessores
imediatos, filhos e netos D. Pedro II, D. João V e D. José I.
A fábrica monumental estava bastante adiantada em 1708, ano
em que transladaram para a cripta da igreja, as ossadas de todos os frades
enterrados no templo antigo. Muito enobrecido nesta centúria por empreitadas
sucessivas a sua sagração, em tempo de D. Maria I, a 1 de Setembro de 1798, foi
presidida pelo Bispo de Beja D. Frei Manuel do Cenáculo, no impedimento do
arcebispo de Évora D. Fr. Joaquim Xavier Botelho de Lima, sendo reitor da
comunidade o pregador jubilado D. Frei Manuel de São Caetano Damásio.
O templo era muito rico de alfaias sumptuárias e de relíquias
sagradas, possuindo uma de S. Paulo, padroeiro e a cabeça de uma das Onze Mil
Virgens, muitas das quais haviam sido oferecidas pelo inquisidor D. Fernão de
Matos de Lucena, secretário do conselho de Portugal em Madrid, que pretendeu
ser seu padroeiro (contestado pelo Duque de Bragança D. Teodósio II) e
finalmente o foi da Capela-mor do convento de S. Francisco de Estremoz.
A casa alimentava 60 religiosos de hábito. Cabeça da sua Província
e sede capitular abrigava, normalmente,
o padre geral no repouso das visitações eclesiásticas. Foram seus derradeiros
administradores comunitários, os padres: reitor Fr. Joaquim de Santa Teresa;
vice-reitor, Fr. José António de Santa Maria Valente; clavário, Fr. Manuel de
Santa Clara Lima, e vice calvário, Fr. João das Dores.
Muito visitada pelos duque brigantinos, seus protectores,
nela estiveram, também, D. Sebastião em 1577; D. João IV várias vezes; D.
Catarina de Bragança, Rainha de Inglaterra, em Dezembro de 1699, e os
turbulentos Meninos de Palhavã, desterrados pelo Marquês de Pombal.
Visita D. Sebastião 1577, tela de artistas anónimos , popular.
O decreto de extinção das Ordens Religiosas, em Maio de 1834,
abrangeu o edifício, que esteve encerrado alguns anos até ser vendido pelo
estado, em hasta pública, à família Sousa Leitão, de Borba, a qual a alienou
c.ª de 1870 a D. Carolina Amélia Fernandes de Torres, casada com Henrique
Correia da Silva Leotte, ascendente do actual proprietário, Eng. Henrique
Leotte Tavares. Abandonado durante muitos anos, padeceu grave ruina com a total
profanação das partes sagradas, e venda do recheio sumptuário do templo e de
outras capelas interiores. Todas estas incúrias foram, felizmente, redimidas na
actualidade com o restauro dos mais importantes membros arquitectónicos do
secular mosteiro, decano dos paulistas portugueses.
Construído numa quebrada da linha meridional da Serra de
D´Ossa, em sítio que os antigos designavam de S. Cornélio, envolvido por
frondosa mata de pinheiros, aloendros e freixos, o Convento de S. Paulo,
apresenta a frontaria alva de caio na sua estrutura de alvenaria do sistema
construtivo alentejano e apenas cunhada, no templo, por grossas pilastras de
granito aparelhado.
No seu aspecto mostra a silhueta da grande reforma resolvida
pelo Conselho da Ordem, e estando como reitor Fr. João da Conceição, assinalada
com notório incremento no verão de 1725 e prolongamento até finais de 1725,
onde se gastaram para cima de 300.000 rs., período este assinalado pela oferta
de inumerável material de obras, incluindo os guindastes, feita pelo lavrador
vizinho Miguel Barbosa.
...
Desde que a herdade e o Convento entraram na posse da família Leotte que se iniciaram os trabalhos de recuperação e restauro, a par com a retoma e desenvolvimento da exploração agrícola, como uma das fontes de suporte das imensas despesas que as obras do Convento exigiam.
Escoou-se o século XIX e metade do século XX até que fosse feita a atual estrada ligando Estremoz a Redondo e passando à entrada do Convento.
O Convento de S. Paulo é hoje em dia um confortável e
requintado hotel.
O Hotel Convento de São Paulo foi inaugurado em 25 de Abril de 1993, a despeito de todas as dificuldades que lhe foram postas e do cepticismo corrosivo daqueles que nada tendo feito, nada queriam que se fizesse e nada acreditavam que fosse possível fazer.